Saúde
Enxaqueca: doença pode comprometer a qualidade de vida
Dores intensas podem limitar as atividades rotineiras
A atriz norte-americana Marcia Cross, conhecida por interpretar “Bree Van de Kamp” na série Desperate Housewives, e a ex-tenista estadunidense Serena Williams são duas personalidades famosas que já declararam publicamente que sofrem com a enxaqueca. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que um bilhão de pessoas lidam com o problema, especialmente mulheres entre 18 e 50 anos. De acordo com o estudo Global Burden of Disease Study, a enxaqueca foi classificada como a terceira causa de incapacidade no mundo.
Segundo a neurologista Ana Carolina Dias Gomes, trata-se de uma dor de cabeça primária que não é causada por outra doença. Além de comum, pode ser incapacitante. A médica conta que muitos estudos epidemiológicos têm documentado a sua elevada prevalência, bem como o impacto socioeconômico e pessoal. “A média é de quatro dias perdidos de trabalho por ano. Como em períodos de crise, algumas pessoas, geralmente, não conseguem ficar em locais com luz ou barulho. A enxaqueca influencia também nas atividades familiares, sociais e escolares”, aponta.
Ana Carolina comenta que a enxaqueca pode ser dividida em dois tipos principais: sem aura e com aura. Na primeira, não há sintomas neurológicos antecedentes à dor, também chamada de enxaqueca comum. A segunda é o nome dado aos sintomas neurológicos focais, derivados de alteração no sistema nervoso: força, sensibilidade, fala. São transitórios e possuem relação com a enxaqueca. Geralmente vêm antes de a dor aparecer.
Causa
A neurologista explica que a enxaqueca é genética. O indivíduo pode ter crises sem motivos. No entanto, a exposição a certos gatilhos aumentam a frequência, como queijos, embutidos, chocolate, café, adoçantes com aspartame, alterações de sono e hormônios, excesso de exposição ao sol, tabagismo, odores fortes e a ingestão de bebida alcoólica. Transtornos de humor, como ansiedade e depressão, também podem frequentemente estar associados a um episódio de enxaqueca.
Enxaqueca x dor de cabeça
A enxaqueca provoca dores unilaterais e latejantes, acompanhadas na maioria das vezes de náuseas, vômitos, intolerância a sons, luz ou cheiros fortes. “As crises tendem a aparecer ocasionalmente, com duração de quatro até 72 horas. Em casos extremos, a frequência pode ser diária. Não existem exames específicos para diagnosticar a enxaqueca. O diagnóstico é clínico, por meio da avaliação médica dos sintomas relatados pelo paciente. Em alguns casos podem ser feitos exames para identificar se existem outros fatores interferindo na dor de cabeça e confirmar a suspeita de enxaqueca”, esclarece a médica.
Ana Carolina alerta que a enxaqueca é bem diferente das outras dores de cabeça, pois a crise não é só a dor. Ela diz que alguns pacientes têm avisos que a dor vem (fase premonitória) ou sentem algumas alterações após o período de dor já ter passado (fase “posdrômica”).
Fases
Fase 1: é a premonitória. No período anterior à dor de cabeça, é comum o desejo por determinados alimentos, como chocolate, alterações de humor, cansaço, bocejos e retenção de líquidos.
Fase 2: a aura, que normalmente vem antes da dor, também pode acontecer com ela e muito raramente, depois. Ela ocorre entre 15 a 25% das enxaquecas. Não é todo mundo que tem e não aparece em todas as crises. “A aura mais comum se manifesta com alterações na vista como embaçamento, pontos ou manchas escuras na visão, linhas em “zigue- zague” e pontos luminosos que duram de cinco minutos a uma hora. Em casos raros podem acontecer auras sem dor de cabeça. Existem muitas outras auras, alterações na fala, perda de sensibilidade ou de força, entre outras”, ressalta .
Fase 3: a cefaleia é o período mais incapacitante e incômodo da enxaqueca. A sensação é a dor de um lado da cabeça e latejamento que pioram com qualquer esforço físico. Além disso, náuseas, vômitos e sensibilidade a barulhos, luz e cheiros podem acompanhar a dor.
Fase 4: posdrômica ou de resolução, é a recuperação do organismo após a dor intensa de cabeça e se caracteriza por intolerância a alimentos, dificuldade de concentração, dor muscular e fadiga.
Tratamento
A neurologista orienta que o principal tratamento é a prevenção, com medidas sendo adotadas para evitar a manifestação das crises, como mudanças de estilo de vida com hábitos saudáveis e evitar os gatilhos para as crises. Ela mostra que apesar de uma série de avanços no diagnóstico e tratamento, apenas 22% dos pacientes com enxaqueca usam medicamento específico. “Essa mesma porcentagem usa remédios que geralmente não dão certo, como os opióides, e 40% dos pacientes estão insatisfeitos com seu tratamento para crise. O tratamento deve ser combinado, alguns aspectos podem ser previstos e um plano traçado com o paciente”, pontua.
Tratamento preventivo
Modificações no estilo de vida e evitar os gatilhos (estresse, mudanças climáticas, flutuações de hormônios sexuais nas mulheres, bebidas alcoólicas, distúrbios do sono, odores, luz, fumaça, calor, certos alimentos: contendo glutamato monossódico, nitratos / nitritos (por exemplo, carnes processadas), queijos envelhecidos e adoçantes artificiais, uso excessivo de cafeína e abstinência de cafeína) são recomendados como medida preventiva para todos os indivíduos com enxaqueca.
A médica lembra que a decisão de recomendar terapia adicional preventiva depende de diversos fatores e os mais importantes são: três ou mais dias de dor de cabeça moderada ou grave por mês, causando piora na qualidade de vida com pouca resposta ao tratamento de crise; pelo menos entre 6 a 8 dias de dor de cabeça mensais, mesmo se os medicamentos de crise forem eficazes; contraindicações para tratamentos de crise; sintomas particularmente incômodos, mesmo se as crises forem infrequentes; a enxaqueca tem um impacto significativo na vida do paciente, mesmo após as modificações no estilo de vida, controle dos gatilhos e uso de tratamento para crise; paciente pode desenvolver cefaleia por uso excessivo de medicamentos; a terapia preventiva da enxaqueca bem-sucedida reduz a frequência e a intensidade das crises.
Estilo de vida
Sono: tenha horários regulares para dormir e acordar, evite celular, computador e TV na hora de ir para cama; mantenha o quarto escuro, silencioso e com temperatura confortável à noite; faça refeições mais leves até três horas antes de deitar; exercícios físicos beneficiam o sono quando são feitos até 4 a 6 horas antes de dormir; experimente a técnica de relaxamento antes de dormir.
Atividade física: exercícios aeróbicos como caminhar, correr e nadar; musculação pelo menos duas vezes por semana; atividade moderada (cinco vezes por semana, sendo 30 minutos cada sessão) e 75 minutos de atividade vigorosa (três vezes por semana, sendo 25 minutos cada sessão).
Alimentação: faça refeições balanceadas pelo menos três vezes ao dia; inclua lanches saudáveis; beba pelo menos 1,5 litro de água por dia, de preferência fora das refeições; 200 mg de consumo de cafeína por dia (quatro xícaras pequenas de café coado); inclua lanches saudáveis.
Estresse: qualquer excesso de sobrecarga ao organismo — é um dos gatilhos mais comuns da enxaqueca, como ansiedade, depressão, irritabilidade, pessimismo, preocupações, autoexigência excessiva, perfeccionismo, traumas psicológicos, eventos de vida difíceis, perdas (exigem mais energia do cérebro, aumentam a excitação psicofisiológica e a probabilidade de uma crise de enxaqueca ocorrer, para quem tem a predisposição). “Através da Terapia-cognitivo comportamental, Mindfulness, Biofeedback e Técnicas de Relaxamento é possível aprender estratégias para um estilo de vida saudável, manejo do estresse e diminuir a frequência, intensidade e incapacidade das crises de enxaqueca”, afirma a neurologista.
Diário da enxaqueca
A médica recomenda o monitoramento das crises de enxaqueca em um diário, anotando os gatilhos. “Leve o diário em suas consultas com os profissionais de saúde e converse sobre os potenciais gatilhos para sua dor de cabeça”, conclui.
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